P. Ademir Guedes Azevedo, cp.
Toda a história da salvação é uma busca de Deus pelo homem. A religião defende a atração do homem por Deus, mas o cristianismo parte de um movimento contrário: Deus atraído pelo homem. Esta é a notícia mais revolucionária de todos os tempos: Deus é Ágape e só Ele pode amar de verdade. Sendo o Amor verdadeiro, toma a iniciativa e revela sua história de salvação dentro da contraditória e frágil história humana. Por meio desta revelação, realizada em Jesus, o homem descobre-se uma criatura especial e, desta vez, é Ele que começa a amar como Deus, mesmo que isto seja uma tarefa sempre imperfeita. Por isso, esta relação é paradoxal, sublime e perigosa. Assim nos ensinam as chamadas “aparições” do ressuscitado. Vejamos.
Duas mulheres, logo cedo, vão ao túmulo e o constatam vazio (Cf. Mt 28,1). Elas caminhavam entre os raios da madrugada: tristes por terem perdido Aquele que lhes ensinou toda a verdade do que é viver, mas algo dentro lhes dizia que nem tudo estava perdido, pois Ele havia dito que ressuscitaria. Elas teimam e insistem em procurar a razão da vida delas. A Memória daquela experiência fazia com que elas caminhassem. Haviam feito uma experiência com Alguém que sabia amar de verdade, mas agora não podem mais tocá-lo como antes. Que relação estranha é esta que se pode amar sem ter mais a presença física do Amado? O cristianismo começa com este paradoxo. O Amado está sempre presente, mas através de uma presença diferente. Ele está ligado ao nosso ser e a nossa relação com Ele nos faz divinos cada vez mais que continuamos humanos.
Dois discípulos, também muito cedo, vão ao túmulo e o constatam vazio (Cf. Jo 20,3). Um havia chorado por provar a amargura de ser traidor. Esta relação era mais paradoxal ainda, pois se tratava de um amor ferido e envergonhado, mas convicto. O outro discípulo tudo indica que já havia feito uma experiência mais profunda, pois na última ceia tinha reclinado a cabeça no peito do Amado. Também dois dias antes no Calvário recebeu a mãe do Amor como a sua Mãe. Por isso, ele viu e acreditou. Mas viu o quê se o túmulo estava vazio? Viu o invisível! Na verdade, ele viu o próprio Amor que daqui para a frente só pode ser uma experiência de fé. Sublime!
Há uma insistência em retornar à Galileia: «Não temais! Ide e dizei aos meus irmãos que sigam para a Galiléia, lá eles me verão» (Mt 28,10). Vou traduzir Galiléia por História em sentido alemão (Geschichte), ou seja, como realidade mais concreta possível. Não se trata de historicidade: uma realidade abstrata ou paralela na qual nos refugiamos quando não queremos nos envolver com os dramas reais, como a fome, a violência, as guerras, as perseguições, calúnias, enfim quando o Ressuscitado nos reenvia a Galiléia (a História) ele quer dizer que temos que continuar a sua vida neste mundo, mas sem esquecermos de sua Cruz! Esta forma de vida perigosa, portanto, é a marca do cristão. De fato, ao cristianismo primitivo não faltaram testemunhas que deram razão da fé com o próprio sangue. Seguir o Ressuscitado não é uma busca de sentido individual, mas é uma ação que leva a doar-se a si próprio em favor do próximo.
A Ressurreição de Jesus, portanto, será sempre o ponto crítico para a fé dos cristãos. Os três critérios propostos aqui são apenas uma chave de leitura para o Seguimento e, creio, devem estar sempre em harmonia, nunca isolados. Quando somos tentados a viver um cristianismo ritualista, com ênfase em esforços pessoais que nos dão a falsa tranquilidade psicológica de estamos cumprindo normas e preceitos exteriores, temos que recordar que nada disso acrescenta ao Amor Ágape de Deus, pois Ele nos ama, independentemente de qualquer Lei ou ritual que observamos. O Ágape será sempre o paradoxo do cristianismo. Da mesma forma, o desafio de nos educarmos para a presença invisível que faz da Ressurreição um mistério sublime denuncia as nossas sociedades materialistas que nos obrigam a viver sempre mirando em direção ao baixo, como se tudo se reduzisse a um ateísmo prático. Por fim, o terceiro aspecto (o perigo) é ainda mais desafiador para quem busca com radicalidade e fidelidade o discipulado, pois ser cristão é viver sentindo os dramas da história, é aprender a não ser alienado com a vida e nunca negar o chão que estamos pisando, é fazer da Cruz de Cristo o critério decisivo para toda e qualquer que seja a ação.