Cartas de São Paulo da Cruz

Uma característica marcante da missão apostólica de São Paulo da Cruz – além das missões populares (em torno de 200) e da pregação de retiros espirituais (em torno de 70) – foi a DIREÇÃO ESPIRITUAL. O recurso utilizado por ele foi predominantemente através de CARTAS. Escrevia de 20 a 30 cartas por semana, como ele mesmo declarou. Escrevia para leigos, sacerdotes e religiosos, sobretudo passionistas. Destas, restam uma parte de 2060 cartas que se conservam no arquivo da Sede Geral da Congregação, em Roma.

Em suas cartas, fica bastante evidente o seu pensamento espiritual e sua contribuição específica para a Igreja de Jesus Cristo.

Carta de São Paulo da Cruz à Irmã Colomba Geltrude Gandolfi, sem data

“Tenha em grande conta e seja constante em estar solitária interiormente, deixando desaparecer (assim direi) esta gota do seu espírito no mar imenso da divindade; mas este vôo de fé e de amor se deve fazer em Cristo Jesus, sempre unida em espírito, sem imagens, à sua Santíssima Paixão. Deus a ensinará tudo, e estando sempre no seio de Deus, desta forma, renascerá sempre à nova vida de amor no divino Verbo Cristo Jesus. Reze os salmos no coro (capela), em verdadeira solidão interior, recitando-os no Espírito Santo. São João Evangelista naquela grande visão que teve do paraíso, viu que naquela soberana cidade não existia Templo e acrescenta que Deus é o templo daquela grande cidade de paz. Oh, quanto é suave realizar a oração, tanto vocal como mental, neste divino templo que é Deus mesmo! Reze também em silêncio de fé e de caridade, neste templo que é Deus; perca-se aí, abisme-se, obedeça aos atrativos do Espírito Santo. Seja muito simples e jamais curiosa de entender as divinas realizações que Deus faz durante este tempo na sua alma dileta. Quem pode compreender? Ame, sofra, cale e esteja escondida das criaturas, etc.”

Carta de São Paulo da Cruzà Sra. Anna Cecilia Anguillara, 27/08/1754

“Comece a sua oração desta forma, por exemplo: ‘Oh, doce Jesus como estava o teu divino coração na agonia do horto! Alma minha, um Deus sua sangue por ti, um Deus em agonia por ti! Oh, amor, oh, caridade! Oh, grande Pai, quanto amaste e ama a minha alma! E eu o tenho ofendido! Oh, ingrata! Ah, doce Jesus, lava-me com o teu sangue precioso, queima-me no teu santo Amor!’.

Firme-se docemente em tais sentimentos, deixe-se penetrar toda do amor de Deus; terminado um (sentimento)  passe a outro, como o Espírito Santo a guiará e lhe ensinará  interiormente; e assim se regule nos outros mistérios da Santíssima Paixão, porque deste modo, você conquistará o costume de viver na  Divina presença e levará sempre sobre o altar do seu coração as penas santíssimas de Jesus.

Também aqueles desejos de amor que sente ao ler a vida dos santos são ótimos sinais; cultive-os, mas com total abandono na divina vontade; e sobretudo, exercite-se nas santas virtudes, principalmente na humildade do coração, na verdadeira paciência, e no sofrer em silêncio, etc. Exercite a misericórdia para com os pobres; quando puder e for oportuno, visite as mulheres mais pobres e enfermas, conforte-as e console.”

Carta de São Paulo da Cruzà Irmã Colomba Gertrude Gandolfi, 21/12/1754

“Ó Irmã Colomba, tenha em grande conta e esteja sempre naquele sagrado e profundo deserto, no qual a pessoa se perde toda em Deus, desapegada de todas as criaturas, elevada, por amor, fora do tempo, no eterno Bem. Ali se alimenta, sem entendê-lo, de caridade, de amor puríssimo em Deus, bem unida por santo amor ao divino Verbo Jesus, que conduz sua pessoa dileta onde Ele está. Isto é, no seio do Pai, no seio do divino Pai e aí, neste abismo de amor, não pode existir nada mais de temporal, mas tudo é do Sumo e Incriado Amor. Oh, que grande coisa eu lhe digo! Mas, não são coisas minhas, são do Senhor, são daquele Espírito divino que ensina aos seus servos”.

Carta de São Paulo da Cruzà Irmã Colomba Gertrude Gandolfi, 18/09/1743

“Minha filha, modere, com a graça santíssima de Jesus, a sua natureza vivaz e espontânea. Assim, todos poderão ver o Paraíso, que está em você, tanto externa como internamente, vivendo a imagem de Jesus Crucificado, todo doce, manso, paciente etc. Digo, imagem de Jesus, porque, quem interiormente está unida com o Filho de Deus vivo, leva esta imagem também aos de fora, com um contínuo exercício de heróicas virtudes, especialmente com um sofrer virtuoso, não se lamentando nem interior, nem exteriormente. Esteja, assim, toda oculta em Jesus Crucificado, sem desejar outra coisa a não ser estar toda transformada por amor no seu divino beneplácito em tudo e por tudo…”.

Carta de São Paulo da Cruzà Irmã Maria Cherubina Bresciani, 09/08/1740

“Esteja, pois, atenta, abra os ouvidos, dilate o seu coração, para que, semelhante a uma concha, receba este orvalho do Paraíso… Agora é tempo de começar a deixar o leite e aprender a adorar com maior perfeição o grande Deus de majestade em espírito e verdade. Para isso, é necessário humilhar-se, aniquilar-se e abismar-se no próprio nada, despojando-se, de fato, de todas as imagens das criaturas e, depois, em pura fé, abismar-se toda em Deus e aí repousar no seu seio divino, mas sem nenhuma imaginação, porque Deus não se manifesta através de imagens. Ele é um espírito puríssimo e simplíssimo, abismo sem fundo de infinitas perfeições. Oh! quão feliz é a pessoa que, morta a todo criado, despojada de todas as imagens das criaturas, permanece toda imersa neste mar imenso de caridade, e aí repousa naquele sagrado silêncio de amor, numa linguagem tão grata a Deus. Oh! fé escura, guia segura do santo amor. Oh! que doçura a sua certeza me traz ao coração!… Filha minha, permaneça toda retirada no seu interior. Feche as portas dos sentidos a todas as criaturas e aí trate a sós com o sumo Bem. O justo vive de fé, porque a sua vida é Deus, e este caro Deus se encontra na obscuridade da santa fé, a qual, para a pessoa amante, é mais clara que o dia…”

Carta circular de São Paulo da Cruz a toda Congregação Passionista, 30/11/1760

“Em frente, caríssimos, ‘renovai o vosso espírito e a vossa mente e revesti-vos de Nosso Senhor Jesus Cristo’ (Rm 13,14; Ef 4,23); e revestidos de Jesus Cristo, fazeis que resplandeça em vós a verdadeira humildade de coração, tanto interna como externamente; exercitai-vos  na verdadeira obediência, na verdadeira caridade que une uns aos outros, na santa mansidão e paciência, suportando-vos uns aos outros’ (Ef 4, 2), compadecendo-vos com grande caridade e ajudando-vos mutuamente; cuidem dos vossos sentidos externos, principalmente da língua, sobretudo quando, por obediência, deveis sair de casa; tenhais grande estima do santo silêncio que é a chave de ouro que guarda o grande tesouro das santas virtudes…  Se assim fizerdes, se verificará em vós aquelas sagradas palavras: ‘Deus se consola nos seus servos’ (2Mc 7,6), porque em vós Jesus Cristo encontrará suas delícias, a Congregação será venerada no mundo. De outra forma, sereis motivo para que a Congregação se transforme em ludíbrio de todos para nossa infinita ruína”.

Carta de São Paulo da Cruz à Irmã Cherubina Bresciani, 01/09/1752

“Não foram as minhas orações, que conseguiram a graça da sua saúde, mas, a misericórdia de Deus, que lhe concedeu mais tempo de vida para que, toda crucificada com o Esposo divino, por meio de uma ‘morte mística’ a tudo o que não é Deus, com a contínua abstração de todas as criaturas e toda escondida no seio do celeste Pai, em verdadeira solidão interior, não viva mais em si mesma, mas, em Jesus Cristo. Ou antes, Jesus Cristo viva em você e, assim, resplandeça a virtude daquele divino Salvador em todas as suas ações, para que todos vejam em você uma verdadeira imagem do Crucificado. E sintam a fragrância suavíssima das santas virtudes do Senhor, na modéstia interior e exterior, na paciência, mansidão, sofrimento, caridade, humildade e todas as outras virtudes, procurando, porém, conservar sempre cuidadosamente o tesouro, tendo-o fechado com a chave de ouro do prudente silêncio sagrado, que permite falar somente quando a glória de Deus o requer e a caridade para com o próximo o exige…”

Carta de São Paulo da Cruz à Irmã Colomba Geltrude Gandolfi, 07/05/1763

“Examine com diligência que efeitos produzem em você a oração: se cresce o amor ao sofrimento, se pratica a verdadeira humildade de coração, também exteriormente, com heróica e silenciosa paciência, com verdadeira caridade e mansidão para com o próximo; se lhe agrada a contínua abnegação da própria vontade, entregando-se sempre e inteiramente à vontade de Deus etc.  Estes são os principais frutos, que deve produzir a oração e, quanto mais ela for elevada, mais heroicamente estes frutos deverão ser produzidos”. 

Carta de São Paulo da Cruz à Agnese Grazi, 30/11/1739

“Você se engana ao dizer-me, que não a trato como quando vem a Viterbo; e eu lhe digo que, no Coração puríssimo de Jesus, desejo sempre mais a perfeição e santidade da sua alma, e gostaria de vê-la de uma vez morta verdadeiramente a tudo, para viver somente em Deus. Se escrevo ou digo qualquer palavra dura, necessita tomar tudo no bom sentido: eu gostaria de ter sempre um ferro cortante na mão, para arrancar e destruir inteiramente as ervas daninhas que nascem no jardim. Você me entenderá: quero dizer que procuro ter a alma despojada de tudo o que não é Deus”.

Carta de São Paulo da Cruz ao Sr. Tomás Fossi, sem data

“Oh! caríssimo Tommaso, acredite-me, que Deus faz uma obra nobre na sua alma: seja sempre mais humilde, afável para com todos, principalmente com os empregados e, em especial, para com a sua esposa. Oh! Você necessita estar todo empastado de mel!

Oração, pouco ou muita, não a deixe jamais; mas sobretudo, tenha em conta o recolhimento do coração, esteja solitário na cela interior, em meio a  todos os afazeres, e trate a sós com Deus; desperte o coração com santos afetos e jaculatórias, mas faça suavemente e com a ponta (direi assim) do espírito que são mais penetrantes. Repouse em Deus, inunda tudo no imenso mar do seu santo amor. Viva feliz em Deus e procure que a sua devoção seja uma doce rede para apanhar todos para o Sumo Bem, onde convêm que seja uma devoção sólida, constante, não afetada, igual, prudente, discreta e toda afável”.